Brasil mais triste sem Marielle

Artigo publicado originalmente no jornal O Globo

Por Talíria Petrone e Monica Benicio

Dia 14 de março de 2022. Quatro anos da maior execução política da história recente da nossa democracia. Quatro anos que silenciaram as vidas de Marielle Franco e de Anderson Gomes. Quatro anos em que perguntamos, incansavelmente, quem mandou matar Marielle. A Marielle vereadora, a Marielle feminista negra, a Marielle mãe, a Marielle esposa, a Marielle amiga. A Marielle de tantas nós, à frente de um projeto que ela expressava em sua luta cotidiana e no qual seguimos acreditando.

Nesses quatro anos sem Marielle, muita coisa aconteceu. O Brasil elegeu um projeto fascista de poder, que teve sua vitória sustentada pelo discurso de ódio e pela disseminação de desinformação. O homem que ocupa a cadeira do Palácio do Planalto segue implementando medidas que destroem o meio ambiente e a vida dos povos indígenas e comunidades tradicionais, que retiram direitos do povo trabalhador e que atacam frontalmente as mulheres, a população negra e a comunidade LGBTQIA+. Enfrentamos a maior crise sanitária vivida pela nossa geração, levando à morte mais de 650 mil pessoas, vítimas de uma política negacionista e anticiência.

Enfrentamos o acirramento dos ataques de ódio contra as mulheres que colocam seus corpos, suas ideias, sua força militante para ocupar cargos na política, sobretudo as negras, trans, lésbicas e bissexuais. A mesma violência política que nos tirou Marielle e que ganha cada vez mais força num país que ainda não tem a resposta sobre quem está por trás de sua execução. E aqui queremos perguntar: por quais motivos esse crime ainda não foi solucionado? Que forças são essas tão poderosas que estão atrapalhando as investigações?

Lutamos diariamente em Brasília e no Rio para que mais de nós tenhamos condições de ocupar os espaços da política institucional. Não só para que mais de nós sejamos eleitas, mas para que possamos exercer nossos mandatos, com segurança.

Quatro anos depois e lidamos com o triste dado de que o Brasil voltou para o mapa da fome e da miséria. A pandemia da Covid-19 agravou as condições de vida da população, e cerca de 20 milhões de pessoas passam fome no país. Sabemos quem são os mais afetados: as famílias de pessoas pretas e pardas, chefiadas em sua maioria por mulheres.

No estado e no município do Rio, a situação também segue dramática. Jovens negros são cada vez mais alvos da política de morte em curso e de uma lógica de segurança pública ancorada nas relações cada vez mais promíscuas entre o poder público, o crime organizado e as milícias. As nossas mães pretas e faveladas seguem chorando a perda de seus filhos para o braço armado do Estado. Uma dor que Marielle acolhia e enfrentava junto com as famílias para que mais nenhum dos nossos fosse um número na estatística do racismo estrutural. Fome, miséria, desemprego, moradias precárias, faltas de vagas no SUS compõem o cenário de tantos problemas do nosso estado.

O Brasil e o Rio de Janeiro sem Marielle são mais tristes. Por todos esses problemas, mas sobretudo porque hoje, assim como todos os outros dias, gritamos pela ausência física da Marielle amiga e da Marielle esposa. Choramos pelo vazio que insiste em aumentar no nosso peito sufocado pela falta de respostas das investigações. Mas Marielle era vida e força pulsante. Por isso, o recado que queremos dar, nesse quarto ano sem ela, é que tem tristeza, tem dor, mas também tem muita resistência. Tem luta cotidiana em defesa da vida e para darmos sequência à sua história!

Por Marielle, pelo legado que ela nos deixou, pelo legado que levamos adiante e por todas que ainda virão!

*Deputada federal (PSOL-RJ)

**Vereadora no Rio (PSOL) e viúva de Marielle Franco

março 14, 2022