Um presidente preocupado em saber detalhadamente quais veículos de imprensa estão acompanhando a profusão de notícias negativas relativas a ele, sua família e seu mandato mundo afora. Um embaixador que, por rompante ideológico, se recusa a participar de evento com acadêmicos de Paris, na França, ao saber que a prefeita da capital francesa faria um breve pronunciamento sobre a vereadora do PSOL/RJ, Marielle Franco, executada num crime bárbaro cujas investigações vêm mostrando reiteradamente a proximidade entre a família do presidente do Brasil e os suspeitos e acusados do crime que chocou o mundo.
O conjunto de informações a que se tem acesso na resposta que o Itamaraty deu a dois Requerimentos feitos pela bancada do PSOL na Câmara – que tinham como tema central a atuação das embaixadas brasileiras na Europa em relação à repercussão do assassinato de Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes – revela algumas graves deturpações que vêm ocorrendo no governo Bolsonaro naquilo que seria o papel do Ministério das Relações Exteriores (MRE).
As mensagens integram os 17 documentos que o MRE finalmente revelou, após a bancada solicitar oficialmente os telegramas internos, instruções e documentos sobre possíveis orientações do Itamaraty a seus postos no exterior sobre o que deve ser dito em relação às investigações sobre a morte de Marielle Franco.
Entre outras coisas, as mensagens mostram que o embaixador do Brasil na França, Luis Fernando Serra, cancelou sua participação em um evento em Paris, realizado em setembro do ano passado, simplesmente porque lá haveria uma homenagem de acadêmicos a Marielle, com um pronunciamento da prefeita de Paris, Anne Hidalgo (Partido Socialista). A informação está em telegramas internos enviados pelo diplomata ao MRE.
Luis Fernando Serra já se envolvera antes em episódio semelhante ao usar argumentos constrangedores (já que é uma autoridade brasileira no exterior) ao responder uma carta de uma senadora francesa que questionou o governo brasileiro sobre as investigações relativas ao assassinato de Marielle.
A resposta de Serra para a senadora Laurence Cohen, que preside o grupo interparlamentar de amizade França-Brasil, foi agressiva e ofensiva. Para o embaixador, era “com profunda consternação” que ele observava “que o assassinato de Celso Daniel e o ataque à vida de Bolsonaro não tiveram o mesmo eco na França que o assassinato de Marielle, que foi até objeto de uma mobilização da Assembleia Nacional”.
Resposta só veio por força de lei
Em fevereiro, Ernesto Araújo recebeu o primeiro pedido de informações sobre a existência ou não de instruções que o governo tem passado a seus postos no exterior sobre como tratar questões relativas à execução de Marielle e sua subsequente investigação. Foram solicitados formalmente todos os documentos, telegramas e comunicações com orientações emitidas pelo Itamaraty sobre o tema. Em 30 de março, Araújo respondeu ao pedido do PSOL, mas esquivou-se de responder se havia ou não uma orientação específica e sem disponibilizar os telegramas solicitados.
A bancada então protocolou um novo Requerimento, alertando o ministro para o fato de que a omissão em responder os requerimentos configurava crime de responsabilidade, assim como “a recusa, ou o não atendimento, no prazo de trinta dias, bem como a prestação de informações falsas, de pedidos escritos de informações a ministros de Estado”.
Fonte: PSOL na Câmara